Recentemente eu li um livro sobre um tema muito atual e que está presente em quase todas as nossas relações inclusive nas nossas relações com os livros que é o utilitarismo. O livro a qual me refiro é "A utilidade do inútil " de Nuccio Ordine.
Ordine fala em seu livro sobre a importância dos saberes considerados inúteis nesse nosso contexto social de super produtividade, materialismo, ou seja, saberes que não tem um valor monetário imediato, se é que um dia terão algum.
Esses saberes como a poesia e a literatura em geral, as artes e a filosofia são responsáveis por algo que vai além do dinheiro (ou do lucro de uma empresa) que é a formação do ser e se bastam por si mesmos.
Mas quem nunca elencou como motivos para ler um livro ou uma poesia o aumento do vocabulário ou melhora na concentração? Esses motivos são utilitaristas apesar de que realmente você os obtém com a leitura.
É nossa tendência humana atribuir utilidade às coisas e desprezar aquilo que não conseguimos visualizar como um ganho prático, palpável.
E devido a leitura do Ordine resolvi ler Vamos comprar um poeta do escritor português Afonso Cruz.
Afonso trata da mesma temática de Ordine, o utilitarismo, porém em forma de ficção.
Em "Vamos comprar um poeta" encontramos uma sociedade distópica onde tudo é contabilizado, inclusive os afetos e uma menina pede ao pai para comprar um poeta .
Os poetas e os artistas de um modo geral eram tratados como "espécies exoticas" , como animais de estimação, por não serem "pessoas lucrativas" .
"Não tenho números suficientes para descrever como me senti feliz com a decisão. Nesse dia, à noite, ao jantar, levantei-me e declarei : Gostava de ter um poeta. Podemos comprar um? "
Ao realizar o desejo da menina de comprar o poeta, transformações ocorrerão em toda família pelo contato com essa outra forma de ser e de viver para além dos números.
De início ela sofre por ser chamada na escola de "inutilista" por ter um poeta. Quem precisa de um poeta, afinal? Mas depois sua sensibilidade é tocada, ela descobre o valor do belo e entende que
" os versos libertam as coisas. Que quando percebemos a poesia de uma pedra, libertamos a pedra da sua "pedridade ". Salvamos tudo com a beleza. Salvamos tudo com poemas".
É um livro de rápida leitura e que tem uma mensagem interessante que procura demonstrar que em uma sociedade que pouco (ou nada como essa distopia) valoriza a arte, esquecem que muitas vezes a arte é o único caminho e a única resposta.
A melhor parte da leitura foi o apêndice, onde o autor faz uma defesa da ficção que já valeu toda a leitura do livro .
" Muitas vezes se justifica a ficção como pretensa fuga da realidade (como disse Eliot, a humanidade não aguenta tanta realidade), como se esta não nos chegasse ou nos magoasse, e por isso necessitássemos da imaginação, um pouco como precisamos de drogas e de entretenimento. Podemos ser mais pragmáticos e descobrir na fantasia uma utilidade bem maior do que esse escape psicológico dos horrores e das injustiças. A ficção não é um escape da fealdade (ou apenas isso), do horror e da injustiça social, é, isso sim, o planeamento para a construção de uma alternativa, a arquitetura de uma outra hipótese de sociedade que seja mais consentânea com as nossas expectativas humanas e morais."
E também dirá que
" A ficção e a cultura constroem o que somos. Não nascemos com pelos e dentes afiados e garras. Criamos roupas e ferramentas, que são sempre produtos da ficção, da cultura. A verdade salva-nos, por motivos evidentes, mas a ficção também. "
Indico. Inclua Vamos comprar um poeta em sua lista de próximas leituras. Dá para ler tranquilamente em um dia.
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Ainda pesquisando as obras do autor me deparei com uma que talvez lhe interesse "O vício dos livros" lendo a sinopse me lembrei de alguns livros que falam sobre livros que você já mencionou. 🤗
Já havia visto a indicação desse livro algumas vezes, mas até então não havia colocado em minha lista. Agora porém já estou até pesquisando outras obras do autor, hahaha
O livro "Flores" desse mesmo autor você já leu?