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Férias + a verdade de Sileno e o sofrimento humano


Resolvi tirar uns dias de férias na praia e esse cenário geralmente me deixa extremamente melancólica e reflexiva. Não sei explicar, mas tenho uma conexão profunda com o mar. É como se ele me lembrasse que a vida vai além daquilo que enxergamos com nossos olhos humanos.


Nossas percepções são enganosas porque limitadas.


No momento que inicio essa escrita, estou sentada à beira da praia, olhando o mar, pensando em tudo aquilo que atualmente tem trazido dor ao meu coração.


Como vocês sabem, estou lendo junto com os membros aqui do blog, A montanha mágica de Thomas Mann. É o nosso calhamaço clássico de 2024. Quem me acompanhava pelo Instagram sabe que esse projeto existe desde 2021.


Como preparação para essa leitura coletiva, fiz algumas leituras prévias sobre os mais diversos assuntos para conseguir entregar o melhor possível a todos os participantes e assim, tirarmos um maior proveito dessa leitura incrível.


Uma dessas leituras foi da obra "O nascimento da tragédia no espírito da música" de Nietzsche.


Essa obra é importante para a leitura de A montanha mágica por tratar dos conceitos do Apolíneo e Dionisíaco que será base das discussões filosóficas que ocorrerão no sanatório.


E foi nessa obra de Nietzsche que me deparei com a verdade de Sileno sobre a existência humana. Uma visão bastante pessimista, inclusive, mas não falsa.


Essa verdade de Sileno me veio agora à memória refletindo sobre os últimos acontecimentos da minha vida.


Sileno era um sátiro que vivia bêbado e era seguidor de Dionísio, o deus do vinho. Sileno acabou sendo capturado pelo rei Midas (aquele da maldição de transformar tudo que tocava em ouro) , para tentar extrair dele qual era o sentido da vida.


Nietzsche nos apresenta a lenda da seguinte forma :


"Há uma lenda segundo a qual o rei Midas perseguiu na floresta, durante longo tempo, o sábio Sileno, companheiro de Dionísio, que se esquivava. Quando finalmente Sileno lhe caiu nas mãos pergunta-lhe o rei o que é o melhor e o mais conveniente para o homem. Firme e imóvel se cala o demônio; até que, forçado pelo rei, declara, entre gargalhadas, o seguinte: "Miserável geração monodiária, filho do acaso e da fadiga, porque é que tu me forças a dizer o que não te é proveitoso ouvir? O melhor para ti, é inacessível: É não ter nascido, não ser, ser nada — em segundo lugar, porém é... Morrer em breve"

O que Sileno nos diz é que viver é sofrer. Viver é dor, já dizia Schopenhauer, e os gregos sabiam disso perfeitamente.


De uma forma ou de outra, todos nós temos essa consciência e procuramos "estratégias" para suportar a existência com todos os seus horrores.


Alguns, como os gregos, precisam revestir o sofrimento de uma certa glória. Foi por isso que eles, os gregos, criaram as divindades olímpicas.


Outros procuram algum consolo metafísico, apoio em alguma ideia de transcendência. Quanto mais sofrimento aqui nesse plano, mais merecedor seremos de uma vida plena no mundo celestial.


Existem aqueles que procuram abafar a dor com prazer, o que obviamente, é impossível já que existem prazeres que levam à dores ainda piores.


O fato é que, já que de acordo com Sileno a dor é inevitável, todos nós procuramos subterfúgios para justificar o sofrimento humano e lidarmos com ele.


Tenho pensado muito a esse respeito.


Minha forma de encarar minhas próprias dores é não sucumbindo ao individualismo . Quando ampliamos a nossa visão sobre os homens e a vida, percebemos que todos estão lutando suas próprias batalhas, tendo que lidar com alguma dor e buscando ser feliz de alguma forma.


O sofrimento não é uma exclusividade de ninguém.


O individualismo nos leva a uma espécie de vitimismo, de "coitadismo" (uma postura que eu, particularmente, não tolero). Estar focado nas próprias dores sem perceber o que acontece ao nosso redor nos desperta o sentimento de injustiça (ninguém sofre mais que eu) , de fracasso (só eu não consigo ser feliz) e de pessimismo em relação ao futuro. Dessa forma Sileno tinha razão. Melhor morrer o quanto antes.


Fugir da armadilha do individualismo e ter uma postura mais empática diante da vida , me fortalece para lutar minhas lutas particulares. Empatia, inclusive, comigo mesma.


E o sentido da vida?


Para mim, o sentido da vida é viver VIVENDO. Nem VIVER LEMBRANDO, com um caso de amor eterno com o que passou, nem VIVER ESPERANDO o que não sabemos se chegará até nós.


É também VIVER ADMINISTRANDO a dor e o prazer.


É VIVER ACEITANDO que nada é permanente. Como dizia Heráclito, a única coisa permanente é a impermanência.


Assim, acredito eu, que boa parte da dor será amenizada.















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2 Comments

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Lindo foto Naty 🤩

Lendo teu post me lembrei deste versículo:


"― Eu disse isso para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo, vocês terão aflições; contudo, tenham coragem! Eu venci o mundo." João 16:33 NVI


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Verdade amiga. Uma das coisas mais difíceis para o ser humano é lidar com a dor e ter coragem pra enfrentar tb não é algo comum. O comum é procurar subterfúgios para colocar essa dor para "debaixo do tapete". Eu penso que coragem é uma das principais características que precisamos ter para viver bem. Quem não tem coragem, tem medo. E viver com medo é não viver.

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