Estou fazendo a leitura do livro "O vício dos livros" do Afonso Cruz (escritor português e autor de "Vamos comprar um poeta" que já tem resenha aqui no blog) e logo no início do primeiro ensaio ele aborda uma questão que me fez refletir .
Ele disse
" Há leitores que anotam os livros, que sublinham, que arrancam páginas, que os enrolam como se fossem revistas , há leitores que dobram os cantos (como eu, mas esse é o gesto mais violento que imponho a um livro. Escrever nas margens, por exemplo, parece-me uma espécie de tatuagem de que me envergonharei no futuro, quando voltar - ou se voltar - a encontrar-me com ele). Por isso, a descoberta de uma página de um romance anotada de alto a baixo pareceu-me especialmente estranha. "
Eu costumo marcar meus livros. Grifo, anoto nas margens, uso flags. Tudo isso faz parte do meu processo de leitura ativa. Tenho a impressão de que tomei posse realmente do livro e do seu conteúdo e que não fiquei na posição de uma leitora passiva que espera simplesmente que o autor me diga algo.
Eu tenho, por exemplo, a minha própria "Madame Bovary", construída a partir da minha interação com o texto.
Fiquei, então, pensando qual a minha relação com esses grifos , marcações, marginálias.
Peguei meus livros na estante e passei horas nesse processo de "me ler" através deles.
Ao contrário do escritor português, não tive um sentimento de estranhamento ao me deparar com essas páginas. Era eu, pura e simplesmente. Vergonha também passou longe das minhas reações.
Senti-me como se estivesse conversando com uma amiga distante... alguém que já foi muito importante para mim, mas que pelo próprio percurso da vida havia perdido contato.
E esse reencontro foi lindo sim e em alguns momentos desconfortável também.
Eu sempre reli os trechos marcados nos meus livros em busca de referências, mas raramente em busca de mim mesma. É um exercício que quero colocar mais em prática.
Como disse José Saramago,
" É preciso sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós."
Marcar , anotar nos livros, é uma excelente maneira de ler a si mesmo através deles. Experimente.
E com um bônus de que, ao final desse processo, o livro passa a ser "o seu livro" , um exemplar único no mundo.
Algo um tanto polêmico este assunto, confesso que grifos e anotações não é algo que faço nos livros físicos. Por isso prefiro os digitais, me sinto mais confortável em gritar e fazer notas neles hahaha 😅 Mas pode ser que com o tempo eu venha a mudar esse hábito.
Gostei muito da sua resenha , também discordo da colocação do autor sobre grifar o livro.O grifo a mim conota sobre a percepção que eu tive sobre aquela narrativa,em alguns momentos chego a discordar da fala e assim assumo meu papel de leitor interativo.