Combray é uma localidade fictícia retratada no romance de Proust, Em busca do tempo perdido. Ela é uma transposição literária de Illiers, cidade centro comercial, de granito cinzento, na região de Beauce, sudoeste de Chartres, na França.
O nome do cidade faz referência a Santo Hilário, padroeiro da cidade.
Em 1971, por ocasião do centenário de Proust, a cidade passou a utilizar o nome composto de Illiers-Combray.
A igreja de Saint - Hilaire (na cidade real de Illiers-Combray chama-se Igreja de Saint-Jacques) é de suma importância no primeiro e no último volume do busca.
O narrador fará uma longa descrição tanto da sua parte física quanto das sensações e sentimentos que essa lembrança fazia ressoar em seu coração.
Para o narrador, essa igreja era diferente de todos os edifícios da cidade. Para ele, ela possuia 4 dimensões , sendo a 4a dimensão a do tempo. Ela guardava em sua arquitetura e mobiliários a passagem dos séculos, resistindo as mais variadas épocas.
A igreja vencia o tempo que tudo destrói.
Ele iniciará sua rememoração falando do velho pórtico que conduzia seus visitantes à pia de água benta e das pedras tumulares que abrigava o pó dos abades de Combray e por isso a fazia adquir um ar espiritual.
Os vitrais da igreja ganharam também grande destaque. Eles passavam a impressão para quem estava dentro da igreja que em Combray sempre fazia bom tempo e mesmo nos dias de pouco sol, seus vitrais irradiavam seus reflexos luminosos.
Os vitrais, para o narrador, era como a sua lanterna mágica que trazia para o seu quarto uma aparência lendária, sobrenatural. É a mesma impressão de quando o sol bate nos vitrais da igreja e os colore.
Um dos vitrais era preenchido em sua totalidade pela imagem semelhante à de um rei de jogos de cartas e em um outro, que era um alto compartimento dividido em uma centena de pequenos vitrais retangulares, predominava a cor azul.
Esses vitrais eram todos muito antigos e podiam ser vistos da rua de l'Oiseau - Fléché.
Duas tapeçarias de trama vertical representavam a coroação de Ester. À Assuero, eram identificados os traços de um rei da França e a Ester, os da Condessa de Guermantes.
A abside da igreja de Combray, para o narrador, era grosseira e destituída de beleza artística e religiosa. O chão era desnivelado e o muro era rude e passava a impressão de se assemelhar mais com um muro de cárcere do que de uma igreja. Ela se encontrava em um cruzamento entre as ruas Saint - Hilaire e Saint - Jaques.
A porta setentrional da igreja dava para a rua Saint - Hilaire e tinha como vizinhos a farmácia do Sr. Rapin e a casa da Sra. Loiseau , onde suas paredes se colavam diretamente na igreja, sem nenhuma separação.
A torre assimétrica da igreja podia ser vista de locais onde ainda nem era Combray. Para chegar ao alto da torre era preciso vencer 97 degraus e por isso era vista de longe no horizonte.
Proust vai falar da maneira como a torre da igreja despontava no céu azul de Combray, parecendo como que riscada a unha para dar àquela natureza um toque de arte.
O cura da igreja dizia que do topo , o olhar do visitante podia abarcar de uma vez só coisas que só poderiam ser vistas individualmente do chão e distantes a mais de um quilômetro de Combray.
Era a torre que, de acordo com as memórias do narrador, anunciava a chegada à cidade do trem que os traziam de Paris no feriado da Páscoa.
Ela era menos alta do que o campanário e impressionava pelos tons sombrios e avermelhados de suas pedras.
E por falar em campanário, esse era o elemento de maior apreço pelo narrador.
Sua avó, que também apreciava esse monumento, o fazia olhar para ele sempre que passavam pela praça. Ela dizia, de maneira bastante terna:
" Meus filhos, podem rir-se de mim, essa torre talvez não esteja dentro das regras, mas agrada-me esse velho ar esquisito. Se ela tocasse piano, estou certa de que não tocaria sem alma."
Era o campanário que conferia à igreja uma existência individual, única. Tudo parecia ordenado em relação a ele que surgia, aqui e ali, entre as casas.
Ao longo da vida, o narrador conheceu várias igrejas góticas com suas torres suntuosas, mas nenhuma delas se comparava a igreja de Combray, pois a memória não conseguia imputar à imagem que o narrador tinha delas, "o sentimento que nos leva a considerar algo não como um espetáculo, mas como um ser sem equivalente." É o sentimento que a coisa desperta em nós que a faz tão especial e não a coisa em si.
Por mais belas que fossem as catedrais visitadas pelo narrador, nenhuma delas fazia surgir do fundo do esquecimento uma parcela profunda de sua vida que é renascida a partir da recordação do campanário de Combray.
A obra de Proust é bastante sensorial e na descrição da igreja, o visual é estimulado no leitor através da sua bela prosa poética.
Tentei nesse post resumir as características e a localização (que será alterada no decorrer do romance) da igreja que também terá relevância no último volume da obra.
Referências das imagens : O mapa foi retirado do livro Marcel Proust, o homem, o escritor , a obra - Edição especial da revista Europe - Editora Civilização Brasileira - Tradução de Ferreira Gullar, 1971 .
Fotografia da igreja em preto e branco: Proust - Edição Vidas literárias - Editora Zahar, 1986
"É o sentimento que a coisa desperta em nós que a faz tão especial e não a coisa em si."
Muito profundo....